Por Gabriel Coelho
Na última sexta-feira, 5 de julho de 2019, foi aprovado na Comissão Especial o parecer do relator Samuel Moreira. A votação, por sua vez, foi marcada por diferentes discussões acerca do tema do projeto: a Reforma da Previdência. Nas ruas não é diferente: todo os dias cidadãos conversam e discutem sobre a proposta do Governo, que afetará diretamente o futuro destes.
Nesse cenário, em meio ao debate, é necessário que tenhamos números, estatísticas e previsões para nos guiar. Entretanto, quando buscamos os dados orçamentários, levamos um susto: o sistema de aposentadorias está falido e consome 59% do orçamento primário federal, deixando somente 41% para despesas básicas, como saúde, educação e segurança. Ainda mais assustadora é a previsão dos economistas Paulo Tafner e Pedro Fernando Nery de que, sem reforma, o nosso arranjo previdenciário consumirá 79% do gasto primário da união em 2026, deixando somente 21% para as outras áreas. Desse modo, ao olharmos do ponto de vista fiscal, percebemos que a Reforma é inevitável.
Ainda assim, apesar da péssima situação das contas públicas, alguns ainda se opõem à reforma, alegando que ela tirará dos mais pobres em favor dos mais ricos, ignorando a questão social. Essas afirmações são, no mínimo, bastante imprecisas quando olhamos para os números da Previdência.
De acordo com o Banco Mundial, a Previdência aloca 40% de seus recursos para a parcela 20% mais rica da população e apenas 3% para os 20% mais pobres. Para efeito de comparação, o Bolsa Família – que é um programa focalizado – tem 44% de seu desembolso destinado aos 20% mais pobres. Em outras palavras, enquanto as alíquotas previdenciárias atuais são levemente progressivas (quem ganha mais paga mais), as aposentadorias são fortemente regressivas (quem ganha mais recebe mais). Desse modo, enquanto o Bolsa Família transfere recursos aos mais pobres, o sistema previdenciário faz justamente o contrário.
O cenário de desigualdade gerado pelo atual sistema de aposentadorias não para por aí e, na verdade, só piora. Afinal, os integrantes do RPPS (Regime Público de Previdência Social) gozam de regalias que não alcançam os participantes do RGPS (Regime Geral de Previdência Social). De forma mais clara, os servidores públicos e militares no Brasil têm acesso a melhores benefícios, menores contribuições e maiores aposentadorias, privilégios que não se estendem aos empregados do setor privado.
Essa exclusividade, além de gerar os maiores déficits per capita e aumentar ainda mais as cifras negativas, faz com que parte significativa dos recursos da previdência sejam destinados a uma parcela ínfima de servidores. A efeito de comparação, funcionários do Ministério Público, do Legislativo e do Judiciário se aposentam, em média, com R$ 18 mil, R$ 26,3 mil e R$28,5 mil, respectivamente, devido à integralidade e ao acúmulo de benefícios que ultrapassam o teto. Por outro lado, os empregados da iniciativa privada não têm esse privilégio, se aposentando com no máximo R$5,5 mil. Sendo assim, enquanto uns poucos servidores podem alcançar o 0,1% mais rico da população, muitos trabalhadores da iniciativa privada não chegam nem perto das cifras necessárias para tal.
Ademais, o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), em um estudo sobre gasto público e desigualdade, demonstrou que a concentração de renda no RPPS é o dobro do RGPS. Na mesma pesquisa foi constatado, também, que o nosso sistema de aposentadorias é responsável por boa parte da desigualdade total do Brasil. Tal número é decorrente do sistema de base contributiva, que tende a replicar desigualdades preexistentes e ainda se divide em dois regimes que operam em regras diferentes. Desse modo, o Brasil se alinha a outros países cujas políticas de assistência sofrem com um viés corporativista e com uma péssima distribuição de benefícios.
Sendo assim, podemos constatar que a Reforma da Previdência não é só uma questão de cunho fiscal, mas também social. Temos a chance de optar entre o atual sistema desigual e largamente deficitário e uma possível reforma que o tornará mais justo, igualitário e sustentável. Por conseguinte, ao reformarmos a Previdência, podemos garantir um Brasil menos desigual.
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