Por Richard Sihman e Yuri Fernandes
Desde a década de 1990 o Japão luta contra o fantasma da deflação. Este fenômeno macroeconômico, ao longo do tempo, vai auferindo maior ganho de poder de compra à moeda doméstica, de modo que as pessoas acabam preferindo consumir no futuro, quando seu dinheiro valerá mais. A deflação cria uma tendência de postergação do consumo, o que faz com que a economia entre em estagnação. Como última cartada para combater esse problema, o Banco Central do Japão anunciou no começo de 2016 que estaria começando uma política de juros negativos, pagando -0,1% de juros ao ano para quem emprestasse dinheiro ao governo japonês.
A notícia confunde a cabeça de muita gente. Como funcionam juros negativos? Quem pagaria para emprestar dinheiro a alguém? Porque o governo adotaria essa medida? Como sempre, a Impactus está aqui para ser sua parceira no entendimento do mercado financeiro
Em primeiro lugar, precisamos lembrar que existem duas taxas diferentes de juros: A nominal e a real. A taxa nominal é quanto o investimento aparentemente rende, e a real é quanto ele realmente rende quando comparado à inflação.
A poupança serve como um ótimo exemplo: Em 2015, a poupança rendia aproximadamente 8% ao ano. Essa taxa de juros aparente é denominada taxa de juros nominal. Em compensação, a inflação no mesmo ano era de 10%.
Já viu o problema né? A inflação é maior que a taxa de juros do seu investimento. Logo, você está perdendo poder de compra ao investir na poupança, na medida que esta sua aplicação estaria sendo remunerada numa proporção menor que aquela que os preços em geral crescem (inflação). A poupança está com juros reais negativos e você está emprestando a juros nominais positivos (8%), porém reais negativos (aproximadamente 10% - 8% = -2%). Logo, era melhor ter buscado um investimento diferente!
Mas o que acontece no Japão?
Atualmente, o Japão aplica juros nominais negativos. É como se sua poupança te rendesse -0,1% ao mês, antes mesmo de comparar esse rendimento com a inflação. Os bancos estão literalmente cobrando para guardar o dinheiro dos clientes, para que o consumo seja antecipado e incentivado.
Então por que alguém emprestaria dinheiro ao governo a taxas de juros nominais negativas?
O investidor empresta porque ainda precisa de um lugar para guardar o seu dinheiro. Resta ao investidor aplicar seu dinheiro em algum lugar no mercado financeiro. Sim, ele poderia deixar seu dinheiro em aplicações que rendem juros nominais positivos, mas essas aplicações não teriam tanta segurança quanto os títulos do governo. Ao investidor que quer proteger seu dinheiro de calote a qualquer custo, emprestar ao governo recebendo juros negativos é uma opção.
Mas e os bancos? Estão emprestando a taxas negativas?
Nada impede que o banco empreste a taxas nominais ou reais positivas, visto que existe o risco de calote, que vai variar de acordo com o cliente.
Por que o governo adotaria uma medida dessas?
A taxa de juros que o governo paga quando toma empréstimos é tida como base para estipular as taxas que os bancos vão pagar aos seus clientes. Se o governo paga uma taxa maior, os investidores vão preferir emprestar para o governo ao invés de investir ou consumir, diminuindo a demanda agregada e a pressão inflacionária. Mas se a taxa de juros é muito baixa (ou no caso, negativa), vale mais a pena consumir no presente ou investir em empresas, obras e outros setores. Neste caso, essa preferência pelo gasto “antecipado” gera mais demanda, pressionando assim a inflação. Desse modo, negativar a taxa de juros é uma medida drástica para induzir os investidores a parar de poupar, promovendo mais consumo, aumentando a atividade econômica e gerando inflação. Em suma, a medida ajuda a tirar a economia da estagnação.
E se a moda pega?
A mesma estratégia de juros negativos é adotada hoje na Suécia, Dinamarca, Suíça e pelo Banco Central Europeu. Existe a possibilidade de outras economias ao redor do mundo aderirem a medida, mas é importante lembrar que os juros negativos só podem ser benéficos em economias estagnadas – com baixíssima inflação - e com problemas para voltar a crescer. No Brasil por exemplo, a adoção de taxas de juros negativas faria a inflação crescer exorbitantemente, o que poderia causar uma crise econômica muito pior do que a atual.
Ainda não é possível dizer se essas aventuras econômicas vão realmente tirar os adotantes da estagnação, a qual também não parece estar perto do fim. Resta a nós compreender os fenômenos para tomar decisões inteligentes no mercado financeiro.
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