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Mercado da Bola - Capítulo 2: O Caso Português

Atualizado: 21 de nov. de 2020

Por Paulo Victor Gonçalves Pinto


Dando prosseguimento a nossa série de textos ‘Mercado da Bola’, hoje abordaremos o surgimento das sociedades anônimas nos principais clubes portugueses.


O mercado financeiro futebolístico português começou nos anos 90, quando em 3 de abril de 1997, visando manter a equidade fiscal, o governo português criou, a partir do decreto de lei nº 67/97, a Sociedade Anónima Desportiva (SAD). A medida visava promover uma maior arrecadação de impostos por parte das associações desportivas ao passo em que também incentivava as equipes a adotarem uma governança corporativa profissional voltada para a lucratividade dos times. No ano de 2012, o capital social mínimo para a constituição de uma SAD era de 997.595,79 de Euros para equipes da primeira divisão e 498.797,90 de Euros para equipes da segunda divisão.


Os principais clubes portugueses como Porto, Benfica, Sporting (clube onde foi revelado o craque Cristiano Ronaldo) e Braga, acompanhado por outros clubes menos poderosos, transferiram seus ativos para empresas de estrutura societária de SAD. A partir daí, as decisões que envolvem o clube passaram a ser decididas em assembleias pelos principais acionistas, no entanto, apesar da abertura de capital, os clubes ainda mantiveram a maior parte das participações com eles, as partes minoritárias foram compradas por investidores-torcedores e dirigentes que buscavam ter poder de decisão em seus respectivos clubes.

Essa estrutura permitiu os clubes adotarem padrões mais elevados de gestão e fiscalização, além de finalmente adotarem uma postura mercadológica voltada ao lucro dos times, o que permitiu a eles realizar negócios entre stakeholders de forma mais eficiente. Ainda assim, com os clubes ainda sendo os principais acionistas, houve uma proteção do clube social, dessa forma, ainda que o clube possa respeitar a opinião de seus outros acionistas e até segui-las em determinados momentos, nenhum investidor ambicioso demais pode realizar mudanças drásticas que desagradaram não somente o clube, mas seus torcedores, como fazer um clube mudar de cidade ou vestir cores não tradicionais em seus uniformes.

Houve também a divisão das ações em duas classes, A e B, algo relativamente próximo às nossas ações Ordinárias e Preferenciais. As ações de classe A são as que dão poder de veto em relação às decisões dos clubes, são essas ações que os times ainda são sócios majoritários, enquanto que as ações B são aquelas comercializadas nos mercados de capitais.


Importante destacar que, no mundo do mercado financeiro do futebol, há uma grande disparidade entre os resultados em campo e os resultados financeiros. Em um estudo realizado por Miguel Henriques Félix da Silva, do Instituto Universitário de Lisboa, foi constatado, ao analisar os relatórios financeiros das 4 principais SAD’s de Portugal (FC Porto, SL Benfica, SC Braga e Sporting CP) entre os anos de 2007 e 2012, que o clube que detinha os melhores indicadores financeiros (como rendibilidade do capital próprio, solvabilidade e autonomia financeira) era o SC Braga, mesmo o clube não obtido resultados tão expressivos quanto os seus rivais nas principais ligas disputadas nas 5 temporadas. O sucesso financeiro do SC Braga deu-se especialmente pelo aumento das receitas de bilheteria e dos prémios destinados aos clube pela UEFA, assim como pelos resultados com transações de passes de atletas, que em 2012 contabilizaram um valor líquido de 13,65 milhões de Euros.

Apesar de haver essa divisão entre aquilo que acontece em campo com aquilo que acontece na gestão, alguns acontecimentos esportivos podem impactar bastante as ações dos clubes. Em janeiro de 2013 o atacante Liedson, do Sporting Lisboa, trocou socos com o diretor de futebol após uma partida da Taça da Liga de Portugal. O fato tornou-se público, o dirigente foi demitido e o jogador multado. Contudo, outra conseqüência chama a atenção: as ações do clube na Bolsa de Lisboa caíram 5.47% no dia seguinte.

Quando se trata de futebol, o caso português nos permite enxergar um exemplo em que a abertura de capital e a adoção de uma gestão corporativa pode beneficiar clubes portugueses a adotar uma administração mais profissional, um maior equilíbrio nas contas dos clubes e, principalmente, um melhor espetáculo aos seus torcedores. Ao mesmo tempo, a estratégia utilizada pelos clubes portugueses de manterem em mãos o controle majoritário das ações permitiu que os clubes ainda detivessem o controle de seus clubes, fez com que os clubes ainda mantivessem autonomia de suas ações, não permitindo se curvarem completamente ao capital financeiro e buscassem equilibrar lucro com sucesso desportivo. Portugal torna-se um exemplo bem próximo de como a transição dos clubes de associações desportivas sem fins lucrativos para sociedades anónimas poderia ser feita aqui no Brasil, fato esse ainda nulo em cenário nacional.

Esperamos que o exemplo de sucesso de nossos irmãos lusitanos possa inspirar os clubes brasileiros a adotarem um modelo de gestão mais profissional, transparente e economicamente viável, e que assim possamos voltar a se tornar uma das principais ligas esportivas mundiais.

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