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O que é Banco Central Independente?

Atualizado: 9 de nov. de 2021

Por José Henrique Matos (Analista de Macro Research)


A atual situação econômica do Brasil é de grande dificuldade por múltiplos motivos, mesmo com a relativa retomada econômica e o controle da pandemia alcançado por meio da vacinação.


A inflação no Brasil, por exemplo, tem sido pressionada a patamares historicamente altos: o IPCA-15, indicador quinzenal da inflação, apresentou aumento de 1,2%, a maior taxa desde outubro de 1995. Com tal índice acumulando 10,35% em doze meses, a inflação passa a ser um problema social grave dado que seu impacto tende a ser mais intenso sobre o poder de compra das famílias de mais baixa renda comparativamente àquelas de alta renda, acentuando ainda mais a desigualdade econômica no país.


Além disso, variáveis importantes como câmbio e o índice Ibovespa vêm ultrapassando momentos de grande instabilidade com as recentes desconfianças relativas à responsabilidade fiscal do governo. Com o objetivo de estabelecer um novo programa de transferência de renda, chamado Auxílio Brasil, o Executivo anunciou uma flexibilização no Teto de Gastos que, na prática, viabiliza o financiamento do novo programa, mas por outro lado produz perda de credibilidade quanto ao controle das contas públicas, hoje em condições estruturalmente deficitárias. Ademais, fica nítida também a intenção do governo em aumentar sua popularidade com tal política de renda dada a proximidade das eleições de 2022, mesmo que isso desorganize as regras fiscais do país.


Inflação acelerada e pessimismo quanto ao regime fiscal são dois grandes problemas que influenciam diretamente nas decisões do Banco Central para a economia como um todo. O Banco Central é, em geral, a maior autoridade monetária de um país e, para o caso brasileiro, seu principal objetivo é assegurar o controle da inflação, embora esteja comprometido também com a estabilidade do sistema financeiro, por exemplo. Portanto, com essas metas, como o Banco Central poderia se relacionar com o cenário econômico atual?


Sob regras estabelecidas, tal instituição poderia executar sua política monetária de modo transparente e autônomo, buscando convergir suas decisões aos seus objetivos. Porém, sujeita a sofrer grande pressão política por governantes interessados em benefício próprio, o Banco Central pode ser forçado a tomar decisões sem caráter técnico, como uma queda forçada e inesperada dos juros para diminuir as dívidas familiares no médio prazo. Nesse sentido, além da inflação e da crise fiscal, o atual quadro de alto desemprego, baixo crescimento e véspera de ano eleitoral é um prato cheio para possíveis interferências no Banco Central, causando piora nas expectativas inflacionárias e maior incerteza sobre a economia brasileira. É nessa situação, portanto, que se faz necessária a Independência do Banco Central, isto é, a dissociação do funcionamento da instituição em relação à vontade política dos governantes.


Conceito que ganhou bastante notoriedade nos anos 90, a Independência do Banco Central (IBC) tem como um de seus maiores defensores o economista Alex Cukierman, que desenvolveu vários trabalhos para estudar a eficácia de um BC independente (Cukierman, 1992). De modo geral, a IBC é estabelecida com base na credibilidade das regras definidas para a política monetária, na reputação conferida ao presidente e diretores da instituição perante os agentes privados e a quem se delega a liderança do Banco Central (ou seja, se o presidente do Banco Central é mais ou menos avesso à inflação, por exemplo). Nesse sentido, os defensores da IBC observaram que um Banco Central cujas metas fossem perseguidas firmemente por policy-makers nomeados de modo imparcial conseguiria atingir os objetivos da política monetária, como a estabilidade de preços, respeitando as regras que garantem credibilidade à instituição.


Para verificar a eficácia desta tese no âmbito inflacionário, os economistas Alberto Alesina e Larry Summers buscaram investigar a correlação entre o grau de independência de 14 Bancos Centrais e a inflação nos países de origem. A conclusão do estudo foi que quanto mais independente é um Banco Central, menor a inflação média do país (Alesina e Summers, 1993). Esse e outros desenvolvimentos empíricos, portanto, permitem demonstrar que o grau de independência de um Banco Central tem impacto sobre a estabilidade econômica de um país.


Grau de independência do Banco Central x Taxas de Inflação

Período de 1955-88



Alesina e Summers (1993) - Elaboração própria


No caso brasileiro, o nosso Banco Central possui um grau de independência notável, mas inferior a vários outros BCs, como o Banco Central Europeu. Em fevereiro deste ano, foi sancionada a Lei da Independência do Banco Central que trouxe avanços no sentido de tornar a instituição uma autarquia autônoma definitivamente: estabeleceu, por exemplo, que os mandatos do presidente e dos diretores do BC não devem coincidir com o mandato presidencial, mitigando, assim, possíveis interferências políticas na instituição. Porém, a nova lei não pode ser considerada uma mudança de paradigma na matéria da IBC, isso porque se usarmos o Índice de Cukierman, uma conhecida métrica que utiliza diversos aspectos para avaliar o grau de independência de um Banco Central, a mudança em questão foi bastante pequena se comparada com outros momentos de transformação na instituição, como durante as reformas econômicas realizadas nos anos 90.


Em suma, o Brasil possui bom grau de independência do Banco Central se comparada com países como a Turquia, mas ainda está atrasado em diversos aspectos que tornaria a instituição mais independente, como a relação entre o Banco Central e o Tesouro, por exemplo. Nesse sentido, são fundamentais para o controle das expectativas inflacionárias e a estabilidade econômica mais avanços na pauta da IBC que coloquem em discussão a importância da credibilidade das regras, a boa reputação dos líderes da instituição e o distanciamento da política nas tomadas de decisão do Banco. Por fim, impedir a interferência política no Banco Central é garantir menor incerteza econômica, potencializando menor inflação e maior crescimento econômico no longo prazo.


Referências bibliográficas:

Alesina, A., & Summers, L. (Maio de 1993). Central Bank Independence and Macroeconomic Performance: Some Comparative Evidence. Journal of Money, Credit and Banking.

Cukierman, A., Webb, S., & Neyapti, B. (Setembro de 1992). Measuring the independence of central banks and its effects on policy outcomes. World Bank Economic Review.



Sugestão de leituras:

Franco, G. (2017). A Moeda e a Lei (Capítulo 9). Rio de Janeiro : Zahar.

Cukierman, A. (1993). Central Bank Strategy, Credibility & Independence: Theory & Evidence. MIT Press.

Crowe, C., & Meade, E. (2007). The evolution of central bank governance around the world. Journal of Economic Perspectives.




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